O Sal. O Gado. As Visões de Mundo de Salgado

 “Minhas fotografias são um vetor entre o que acontece no mundo e as pessoas que não têm como presenciar o que acontece.”

(Sebastião Salgado)

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O sal e o gado, forjaram Sebastião Salgado. Sua história é tão bonita que até quando se tenta resumí-la em uma frase, ela vira rima.

“As pessoas são o sal da terra”. É essa constatação que dá o nome, o tom e o sabor a um documentário inspirador : O Sal da Terra. O filme não apenas conta a história de um contador de histórias, ele revela o que existe por detrás das histórias registradas em cada uma de suas fotografias. O propósito que impulsiona este trabalho missionário, que vai ao limite de arriscar a  própria vida para dar vazão à arte de escrever com a luz.

Salgado não fala expressamente, mas deixa a impressão de que é por amor. Amor à experiência humana. Amor este tão sublime que não o impediu de aproximar-se dos rostos jovens envelhecidos pela dor; que não o fez recuar diante das misérias talhadas pelo poder e pela violência; que fundiu o economista com o fotógrafo para entender e apreciar a vida dos homens e mulheres que construíram o mundo; que algumas vezes colocou a câmera de lado para poder aguar de dentro pra fora.

Através de sua arte e da sua capacidade de estar em todos os lugares, sem perturbar a paz, Salgado nos aproxima mais de Deus. Dá a impressão de que ele bem poderia ser seu enviado de Deus, atendendo ao chamado de observar a Terra e comunicar aos seus habitantes o que se passa em cada um dos recônditos deste vasto planeta. Um mensageiro que nos convida a olhar além do horizonte do nosso umbigo, sem cobranças, sem pressão, apenas nos relembrando que apesar de diferentes somos tão iguais. O outro bem poderia ser você.

A honestidade de seu trabalho poderia chocar, mas não o faz. Parece que as fotos por ele tiradas, foram em verdade entregues. Doadas, com confiança e desespero, na esperança de que fotos mudas pudessem ouvidas pela surdez dos que mandam no mundo.

Mas Salgado, divino, é humano. E o filme resgata, sobretudo, sua humanidade. O homem que se apaixona. O pai. Alguém que chora e que quase desistiu, pela dor, de ser um fotografo da condição humana. O filho que ao retornar às suas raízes, se cura pela terra, da tristeza de suas perdas.

E, entre tantas imagens, fatos e relatos que impressionam, sobressai sua capacidade de transitar. Não só a óbvia transição de carreira, da economia para a fotografia. Ou, transições geográficas, de Minas, para o Espírito Santo, depois São Paulo, Paris, Londres, Angola, Moçambique, Estados Unidos e outras dezenas países por onde andou. Ou ainda as transições sociais, que o levaram do presidente Reagan aos mineradores de Serra Pelada. Ou aquelas que atentam contra o instinto de sobrevivência, da violência das bombas no Iraque à brutalidade dos tiroteios de Ruanda. Ou a de transitar da (des)humanidade da civilização, à natureza que o homem não foi capaz de tocar. Mas a de transitar entre o início e o fim.

De transição em transição, Salgado hoje se encontra no lugar de onde veio. Deu a volta ao mundo, para fechar seu próprio ciclo. De filho do fazendeiro desmatador a professor de reflorestamento. Por meio de seu Instituto Terra, ele ensina como recuperar a Mata Atlântica. O fotografo de uma realidade muitas vezes intragável, agora ensina pelo exemplo, como podemos criar a fotografia de um mundo desejável. A cura do coração devastado de Salgado permeia a visão de como o mundo pode voltar a ser.

Dessa vez, não pela fotografia, mas pelos olhos de quem tem uma percepção positiva da terra, Salgado escreve mais uma vez sua carta de amor à humanidade e ao planeta.

Em francês, conta-se a trajetória do filho do fazendeiro do vale do Rio Doce que se descobriu artista, em Paris. A Paris, das sombras. Vítima  (e algoz) da barbárie que dividiu com Minas, olhares, atenção e orações. A Paris, das luzes, que acolheu um Salgado exilado da perseguição ditatorial e abriu seus olhos de fotografo para sua verdadeira vocação. Mas mais que isso, abrigou por muitos anos o embaixador do projeto que pretende resgatar Mariana da sua tragédia. E, que hoje compartilha conosco sua mais iluminada constatação: a destruição da terra é, sem dúvidas, reversível.

Publicado em: Arte

Um comentário sobre “O Sal. O Gado. As Visões de Mundo de Salgado

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