♔ Antes Só Que Desacompanhada

Desligou o telefone com um riso choroso. Aquele riso que surge no meio da tristeza e que faz você rir e chorar ao mesmo tempo, como se estivesse em pane elétrica. Cogitou que o que ouvira era uma brincadeira, mas não achou o riso, nem na hora, nem depois.

Não podia ficar ali nem um segundo além da eternidade dos quinze minutos já passados até o recebimento da ligação. Inaceitável prolongar a inércia de quem estava tão imóvel quanto a taça de vinho sobre a mesa, à espera de ser sorvida pelos lábios que anunciaram não mais chegar.

Largou uma nota sobre o prato e pegou o primeiro táxi que passou pela rua. O motorista falou do tempo, do trânsito, da novela, da briga com a esposa na noite anterior. Apenas monossílabos interrompiam o silêncio. Porque diabos existe essa necessidade cultural de puxar conversa com quem está calado? Como se conversar fosse companhia, como se falar fosse favor.

Closer

Nesse exato momento, deu-se conta do quanto era tonta. Só estava passando por tudo aquilo, porque trocou a companhia de si mesmo para matar o medo da solidão. Continuou com medo e com solidão, matara apenas o amor próprio.

Identificou a decepção para consigo. Sentiu uma tristeza que não se devia à acidente, terremoto, notícia ruim: a vítima era apenas a consciência de que guardava dentro de si sentimentos desarrumados e confusos.

Por que insistia tanto em se enxergar como parte ofendida, apenas pelo fato de estar só?  Precisava parar de se colocar como refém de encontros inúteis apenas para circular o sangue. Não podia mais se prestar ao papel de mediar conversas rasas apenas para desabotoar a boca. Por que sempre se render à pressão da quinta, da sexta, do sábado à noite?

No início doeu. Mas aos poucos aprendeu a amar a ausência, assim como se ama a presença. Com tempo substituiu a saudades do que não foi pelas saudades do que há de vir.

Hoje está bem. Em paz. Ainda procura alguém? Não. Quer ser encontrada. E só concordará com a entrega se valer à pena. Acredita que é apenas questão de tempo. É otimista, afinal. Chegou à conclusão de que o otimista sofre uma vez: na ausência da confirmação. O pessimista, duas: antecipando e cumprindo. Queria sofrer o menos possível.

Mais. Passou a não confiar em quem não gosta da própria companhia. Dos que não ficam um pouco em si mesmo. Passou a desconfiar de quem liga logo no dia seguinte, se o encontro anterior nem foi tão bom assim. Deixa cair na caixa postal. Psicopatas também são amáveis.

Percebeu que um solteiro pode ser inteiro, estando só. Um casal pode estar acompanhado e sentir-se pela metade. Nem tudo que é par é completo. Dentro de si, nunca mais viu-se sozinha.

(♔L.A.M.L.)

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