Era uma vez um tempo em que andar de mãos dadas era mais difícil do que ganhar um beijo. Naquela época ninguém voltava sozinho pra casa, mas não se formavam casais. Arrumavam-se pretextos e ninguém falava o que queria. A empatia, as afinidades, a intimidade já estavam descobertas, mas existia a insegurança de apressar. E, a inquietação de demorar. Difícil era acertar o ritmo de fora, com o ritmo de dentro.
Nesse cenário eles se chocaram. Sim, choque. Em dadas conjunturas, o encontro entre duas pessoas nem sempre era algo bom. Primeiras impressões perfeitas, conversas incríveis, olhos cintilantes, frequentemente não se repetiam. Nada era garantia de nada.
Sintomático então, que depois de conhecê-lo, Ela já pudesse sentir sinais de preguiça anunciada. Os pedidos de conselhos aos amigos para no final fazer tudo diferente. O esforço de parecer inteligente quando não havia o que opinar. A suspeita de não ser interessante o suficiente para prender a atenção. A perda de concentração no trabalho, os atrasos contumazes de quem não viu o tempo passar. A mobilização mental intensa para prestar atenção na conversa, na leitura, na música, no filme, a despeito de estar com a cabeça em outro lugar. A ansiedade da espera para que algo acontecesse e mudasse o rumo do dia. As tentativas de alterar o trajeto para apressar o encontro. Não sabia se tinha energia para viver essas coisas mais uma vez.
Na sua cabeça o prelúdio de gostar de alguém já lhe dava cansaço. Mas, sobretudo, medo. Medo de que ele fosse um canalha, medo de que ele fosse romântico. Medo de ele ser caseiro demais, medo de ele ser boêmio de menos. Medo que fosse o homem certo na hora errada, ou o homem errado na hora certa. Medo de sentir a certeza de que no fundo não se sabe exatamente o que se quer… Medo de ele ser melhor que as suas respostas e pior que suas dúvidas. Medo de não querer se repartir com mais ninguém além dele, medo de não querer repartí-lo com ninguém, nem mesmo com seu passado. Medo da brincadeira simulada quando falava sério e, de bancar seriedade quando era apenas brincadeira. Medo de convidá-lo a entrar. Medo de vê-lo sair. Medo de estragar a felicidade por entender não merecê-la, medo de não mastigá-la por respeito, medo de passar por ela, sem reconhecê-la. Resumindo, tinha medo de que o telefone tocasse, mais medo ainda se não tocasse.
Mas, teve um dia, que o telefone tocou. Travaram alguns minutos de conversa. Ele trocou de roupa e, Ela trancou a preguiça, o cansaço e o medo numa gaveta dentro do peito.
Ela não sabia ainda o que era aquilo, mas sabia que seria mais grave não ter lembranças do que precisar esquecer. Sabia que doeria mais concluir que o final poderia ser diferente se houvesse a chance de um começo. Enfim, decidiu que não iria guardar o cheque em branco na gaveta só pelo receio de descontá-lo e descobrir que voltou sem fundos. E se tivesse fundos?
Apesar da carência de confiança daqueles que vivem em tempos de crise. Apostou. Se não fosse a história que buscava, fecharia o livro. Ponto.
O desfecho não era o que idealizara, mas tampouco teve vontade de buscar outro romance. Quem os conheceu afirma que conseguem ser felizes até hoje. Acredite se puder.
Fim.
(♔L.A.M.L.)